Ela esqueceu de tomar o remédio, mas na verdade esqueceu que havia tomado-o. Dormiu dois dias seguidos, com a porta aberta. Os cachorros que sempre vagabundeavam pela redondeza entraram, comeram toda a comida sobre a mesa, rasgaram o saco com as fotos talvez por achar que também fosse comida, talvez por diversão, e destruíram recordações que iam de 1977 a 1991. A sorte que foi que o gatinho, Mimado era o nome, chegou e pôs os curiosos para fora com patadas nas fuças dos pobres bichos, todos com costelas à mostra. Muitas fotos ainda foram salvas assim, mas não foram mais vistas. Quando suas sobrinhas apareceram para visitá-la, vendo-a estendida no sofá, o gato a seus pés e toda aquela confusão na cozinha e sala, imaginaram o pior, mas não conseguiam se decidir: ou ladrões entraram lá, ou ela estava morta há dias e o gato detonou tudo. Finalmente perceberam que ela apenas dormia, e acordaram-na para o pesadelo de levá-la para o asilo, onde ela não podia cuidar de suas coisinhas. Bem de saúde até então, rapidamente adoeceu e se foi. Todos estavam contentes por ter tomado a decisão certa, não a abandonando para morrer sozinha em casa.
1 comment:
carajo, que trágico!
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