O aplique sugeria que era ela vaidosa. Também era vulgar, depreendia-se pelas altas botas de camurça deixadas à mostra por uma minissaia jeans e também pelo modo de mascar chicletes com a boca aberta. A blusa jeans por cima da camisa listrada que esconde os diminutos peitos fedia aos cigarros que ela fumava compulsivamente. A voz estridente e o olhar cheio de escárnio me fazem ter certeza de que ela é solteirona, mas se acha esperta o suficiente para sentir-se poderosa ao rebolar a bunda desprovida de carnes em um show da Ivete Sangalo.
A risada estrídula é pior do que a voz. Ela fazia questão de escancará-la às gargalhadas. O cabelo tingido do vermelho típico das quarentonas era a senha para a brancura que os dominava. O rosto trigueiro e magro, com os ossos protuberantes, era cheio de manchas senis. Tinha todos os dentes, mas eram amarelos e alguns decididamente estavam em bizarros ângulos, quase obtusos. Parece-me um bom desafio: fubanga, mas com auto-estima. Talvez fosse fácil, talvez fosse procurar chifre em cabeça de cavalo, como diriam meu pai e tios.
Má idéia. Ela gosta de conversar – de falar pra caralho, na verdade. Pior: tem alguns valores com que me identifico e os quais nunca encontrei nas mulheres que tive. É membro da Sociedade Protetora dos Animais. Não dá dinheiro para igreja nenhuma. Faz questão de dar esmolas. Pior ainda: na verdade, é maldosa e fala mal de várias pessoas que não conheço, mas que ela cita sem apresentação prévia, como se também fossem da minha convivência. Para cortar a conversar descarrilada, meto-lhe um beijo. Rolou, mas não rolou o que interessava. O resto da noite foi desperdiçado com mais aluguel sobre desconhecidos e uma longa viagem para uma quebrada que eu não conhecia e na qual me perdi ao voltar para casa, só encontrando o caminho quando começava a amanhecer.
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