A casa estava aparentemente
arrumada. A sala estava brilhando.
Bastou abrir a porta da cozinha e
ver as toneladas de louça acumulada na pia para notar que era mero jogo de
cena. Mas ele logo fechou. Ela não percebeu. No quarto, na estante antes
arrumada, havia muito pó. Fez vista grossa para bancar o fino. Os sinais de
depressão nela e no ambiente eram explícitos. Preferiu olhar pela janela. As
montanhas ao longe, eclipsadas pela poluição, sussurravam a lembrança de casa,
em Minas. Perguntou-se o que fazia ali de novo, depois de tantos fins
conflitados, tantos adeuses. Ela estava com calor, de calcinha e sutiã. “Imagina
que isso aqui é a praia, nem esquenta, porque já tá quente demais”, ela
galhofou, às gargalhadas. Desde que estivesse bem-humorada, o humor dela era irretocável. Ele pensou em dizer que ela poderia ganhar muita grana fazendo stand-up.
Optou por apenas rir, contemplá-la brevemente e continuar a olhar pela janela.
Qualquer palavra em falso que a ofendesse, sabe-se lá por que razão esdrúxula,
poderia resultar numa treta titânica.
Ele sentiu a mão afagando-lhe o
peito, depois de muito papo furado. Ela não deixou que ele pagasse o jantar,
nem o café da manhã, nem o almoço. Fez ovos mexidos de manhãzinha.
Despediram-se. Esqueceu uma
camisa, de propósito, para poder buscá-la. Ela mandou um amigo, que até então
nunca tinha visto, entregá-la. O amigo não era nada amistoso. Ela nunca mais
atendeu os telefonemas e bloqueou todas as formas de contato. No bolso da
camisa, um bilhete com um beijo de batom e um adeus foi lavado e o fim,
incógnito, converteu-se em reticências fantasmagóricas.
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