Os garotos reúnem-se na esquina.
A conversa não tem sentido. Discutem se o U2 é da Austrália, dos Estados Unidos
ou do Canadá. Todos estão errados, mas têm certeza de que estão certos. Daniel
e Marcão, que não eram exatamente chegados, mas meros conhecidos que orbitam em
volta de amigos em comum da rua, exaltam-se e chamam-se de burros, ignorantes e
por aí vai. Diante das risadas dos outros moleques, decidem-se calar-se, numa
trégua tácita.
A conversa toma o rumo das garotas. Elas não
ficam mais no bairro. Já têm 14 anos, ficam com outros moleques, todos mais
velhos, preferem ir ao centro. A verdadeira preocupação dos que se reúnem na
esquina, com idade média de 13 anos, era fazer piadas com Adriano, que era flamenguista,
porque o time dele jogava “cu Zico”, além de várias outras infâmias. Todos ali,
no entanto, sem exceção, contam histórias de meninas com quem já haviam ficado.
Tudo mentira. Daniel é o único que ficou quieto. Somente ele já havia beijado
uma menina.
Lá pelas duas da tarde, já com o
sol menos assassino, vão jogar bola na rua. Má ideia, pois o sol ainda é
inclemente. Aguerridos, suados, jogam a sério, querendo vencer, algo que nunca
faziam. Marcão erra a bola e chuta a canela de Daniel, que desaba no chão,
gritando exageradamente. Não era pra tanto. Mas já havia uma tensão. Daniel
levanta chamando o desafeto de cavalo. Marcão o chama de bichinha. Daniel não
deixa por menos.
- Como posso ser, se eu já fiquei
com a sua irmã?
Era verdade. Marcão logo intui
isto, pois não entendia por que Daniel sempre ficava brincando com os moleques
mais novos, de uns dez anos, na porta da sua casa, e ainda assim sempre
conversava com sua irmã mais velha. Num
final de tarde, chegando na esquina, viu Daniel saindo de sua casa e ficou
intrigado com aquilo. Agora está explicado.
Atracam-se. Esmurram-se na cara
sem pena. Não acertam em cheio, sempre pega meio de lado, pois se mexem demais
e seguram-se pelas golas das camisas. Forma-se uma rodinha em volta,
estimulando-os a saírem mais na pancada ainda. Mal rolam no chão, no entanto, e
são separados.
Atônitos, encaram Júnior, que
mora em frente e saiu na porta de casa para entender a algazarra. Lutador de
kung fu, já maior de idade, grandão, sacana e famoso por meter-se em brigas na
escola. Estão suspensos pelas camisas. Júnior ri e o joga-os cada um para um
canto. Intimamente, ambos têm certeza que apanharão de Júnior; sabe-se lá o
porquê da intervenção.
- Vão embora vocês dois daqui.
Vocês não têm idade para sair na porrada não – ordena Júnior, gargalhando.
Os olhares curiosos aguçam-se.
Marcão sai sem conseguir conter o choro. Daniel apressa-se a sumir dali, mas não sem antes gritar um “chora mesmo, mariquinha”. Corre e ri. Ao chegar em casa, mete-se logo no banheiro, para a mãe não ver o estado em que está, e toma banho. Os ralados nas pernas e nos braços ardem e as lágrimas confundem-se com a água do chuveiro. Convence-se de que não está chorando.
O nome do conto, embora o conteúdo não fale a respeito, é uma referência ao grupo gótico/pós punk irlandês Virgin Prunes. Na foto, a capa do disco ...If I Die, I Die (1982), aqui reproduzida via licença Creative Commons. |
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