Este artigo foi publicado na página 8 da edição 7866 no Jornal da Cidade (de Poços de Caldas/MG) em 26 de novembro de 2022. Eu mesmo revisei o texto, portanto posso ter deixado passar alguns erros.
Recentemente Lua Ferreira
passou por Poços de Caldas e não tive o prazer de conhecê-la. Ainda bem para
ela e outros convidados de uma festa de halloween a qual acabei não indo, pois,
poucos dias depois, pela primeira vez, tive Covid-19, atingido por essa maldita
nova onda que ora se avulta. De qualquer forma, descolei um exemplar de seu
livro de estreia, Passageira, lançado pela Crivo Editorial em agosto deste 2022
que se finda. Ela é uma poeta de Além Paraíba (MG) e tem um perfil muito
popular de poesia no Instagram (@soul_de_lua), com quase 180 mil seguidores. A
contemporaneidade é a marca da sua poesia, portanto: é concisa, adequada para a
publicação naquela plataforma/aplicativo, algo reforçado já na epígrafe que
abre o livro, uma citação da poeta Marceli Andresa Becker (que encurta seu nome
artístico para Mar Becker, tal como Luanna Ferreira, a Lua), outra potência da
poesia brasileira contemporânea, a qual conheci lendo-a, claro, nas redes
sociais. Passageira divide-se em duas partes. A primeira é denominada Ponto
Morto e o tema preponderante, numa primeira leitura, é a ruptura, impressão já
dada no primeiro poema. Poucos têm título, alguns possuem apenas uma frase,
avizinhando-se, portanto, dos aforismos. “O que não vivemos é tudo que nos
falta.” é a totalidade de um, outro resume-se a “encontrar uma sombra na
espera”. É o que basta, a autora é uma mestra na concisão. Tanto que alguns
poemas mais longos perdem o impacto ao ganhar narratividade. Numa releitura,
essa primeira parte não parece tão melancólica. Há poesias espirituosas, como a
que faz alusão ao mito de Ícaro: “minhas asas/sua beleza/sol e cera”. Há
brincadeiras jogando com as palavras e paradoxos: “Tem gente que se acha/Eu me
perco”. Uma das poucas poesias que foram tituladas, Bloco de notas, embaralha
os sentidos: “segurar a onda e evitar/desnecessárias ressacas”. O alívio lúdico
dá equilíbrio a essa primeira parte. A segunda chama-se Cinesia, que vem ser a
capacidade de movimentar-se (tive que consultar um dicionário, desconhecia a
expressão). Faz sentido: aqui o mote é a paixão e as descobertas oriundas da
convivência. Vem como um bálsamo, mas não é tão impactante quanto a primeira
parte – ou, melhor dizendo, impactou-me menos. A subjetividade de cada leitor
que pesará isto, mas são dois movimentos complementares. O tom muda, algo que a
poesia que abre essa parte também prenuncia. A singeleza de alguns poemas resvala
na obviedade, infelizmente, mas também há pérolas: “você na multidão/é a
multidão”, “Teus desertos/Me dizem/Oásis”, “pintei meu abismo de céu e subi”.
Bastava cortar algumas páginas na edição e haveria um todo muito robusto.
Daniel Souza Luz é jornalista,
professor, escritor e revisor