Deus Baco desgraçado, não vou mais te adorar, maldito!!! Só porque você é um deus do balaco-baco que promove intensos bacanais, bebedeiras e sessões de espancamentos, não necessariamente nessa mesma ordem, isso não significa que eu tenho que te achar foda e te adorar. Você é um filho da puta de proporções gigantescas, um baita machista, egoísta, presunçoso, que desperdiça seu poder divino com prazeres carnais, vazios e doentios. Você ainda vai se afundar na sua própria lama, seu lazarento: tomara que Zeus te lance no inferno e Hades solte o cão Cérbero pra comer seu pingolim com uma de suas cabeças e seu cérebro com a outra, miserável filho de uma fêmea de unicórnio!!!
Fernando Lellis, Jornal Bacanal 2.3, seis de junho de 2001
Publico pela primeira vez um texto que não é meu aqui. Fernando Lellis era um ouvinte do Programa Pirata, que eu produzi junto com amigos nos meus tempos de universitário na Rádio Unesp FM de Bauru, na segunda metade dos anos 1990; ele mandava cartas para o programa pedindo músicas (entre as que me lembro, do Dominatrix e Pin Ups) e fazendo sugestões. Um dia ele abordou a mim e a minha namorada à época num show do Autoboneco/Bonequinho em um fliperama abandonado na Avenida Rodrigues Alves. Gostamos muito dele e da conversa. Ele se parecia um pouco com o Thom Yorke, era tímido, solitário e muito inteligente. Apesar da timidez, nos shows ele era uma figuraça: participava das rodas de pogo e imitava ataques epiléticos, mas não era uma imitação literal do Ian Curtis, ele tinha o próprio estilo. Na coluna que ele mantinha no site do Street Bulldogs (banda da cena punk hardcore dos anos noventa) e em especial nesse fanzine dele, o Jornal Bacanal, ele falava abertamente sobre sua solidão. Troquei alguns emails com ele depois que me mudei de Bauru, mas o último e-mail que enviei, em 2003, não teve resposta. Apenas recentemente descobri que ele morreu de leishmaniose (úlcera de Bauru) em meados da década passada. Fiquei chocado. É injusto demais. Fica aqui minha homenagem a alguém tão legal, espero que a família não se importe em reproduzir o texto dele, pois não tenho nenhuma intenção comercial; revisei este texto, uma espécie de miniconto/desabafo, e espero que seja lido por muito mais gente, nesta época de redes sociais, do que na época dos fanzines e zines online (e o site do Street Bulldogs nem existe mais...). Agradeço muito à minha amiga Tico (Ana Paula Benini), que me cedeu uma foto do seu acervo pessoal para enriquecer esse pequeno texto de memória.