Esta crônica foi publicada na página 9 da edição 7549 do Jornal da Cidade (Poços de Caldas/MG) em 11 de setembro de 2021. Eu a escrevi à queima roupa pouco antes do horário do fechamento do jornal e não passou por revisão, a não ser por mim mesmo agora, para publicação no blog. Fiz pequeníssimas modificações; a principal foi desmembrar a última frase.
Já escrevi uma crônica sobre
as eleições de 1989: para mim foram divertidíssimas. Eu sei que teve baixaria até
que parecida com as de hoje, como a vergonhosa edição que a Globo fez do debate
entre Lula e Collor, abordada no documentário Além do Cidadão Kane. Outra
história famosa é a do sequestro do empresário Abílio Diniz por um grupo de
extrema-esquerda do Chile, o MIR: quando a polícia encontrou o cativeiro e
prendeu os sequestradores, os apresentou com camisetas do PT, as quais teriam
sido plantadas. Enfim, era jogo sujo sem meios virtuais. Mas tudo isso estava
fora do meu radar, eu era novo demais. Mesmo assim, acompanhei as eleições com
relativa atenção. Apesar de ainda existir a União Soviética, esses papinhos
furados de fantasma do comunismo me pareciam bem insignificantes. O ambiente
era muito mais de alegria, devido à redemocratização; não era algo tão
conflagrado quanto agora. Eram muitos candidatos à presidência e os debates
eram muito engraçados. Eu levei na galhofa, apesar de saber da seriedade e da
importância. No meu anarquismo pueril, eu queria mais era zoar todos os
candidatos. O que efetivamente fiz, mas isso já contei na crônica que mencionei
na primeira frase, chamada República Selvagem, publicada neste Jornal da Cidade
anos atrás. Nela, conto que Brizola almoçaria na minha casa durante a
campanha. Meu pai era filiado ao PDT e brizolista roxo. No entanto, minha mãe
vetou a ideia, pois o apartamento em que morávamos era muito acanhado. Era num
predinho do BNH, o Minha Casa, Minha Vida dos tempos da ditadura. Ela achou que
não ia dar certo um monte de correligionários dele e mais equipes de TV lá. E
ela estava certa, não caberia. Como já disse, achei uma pena, pois seria divertido
vê-lo xingar o Collor dentro da minha casa. Mas, pensando bem, acho que
acabaríamos discutindo. Sei que o Brizola foi um sujeito muito corajoso, teve
vários méritos, impediu um golpe de estado em 1961. Posso até admirar isso, mas
eu já o achava um populista. O jeito dele falar me irritava e os seus
imitadores daqui mais ainda – meu pai não imitava o jeito dele falar, ao menos
ele tinha personalidade própria. Imagina se ele entra no meu quarto e vê pôster
de skate e videogame. É certeza que iríamos bater boca. Consigo visualizar ele
criticando tudo, dizendo que são coisas da “juventude americana” ou algo assim.
E eu retorquiria dizendo que ele era um velho gagá. E se ele visse alguma
Playboy lá? Acho que teria uma síncope. Consta que ele quis ou conseguiu
impedir uma parente (Neusinha Brizola, salvo engano) de posar para a revista. Acho
não tínhamos mais armas de brinquedo àquela altura, mas não tenho certeza. Era
capaz dele pegar e jogar no lixo. Hoje eu acho que ele está certíssimo, mas é
óbvio que eu não ia engolir isso. Não, estou exagerando; ele ia criticar tudo,
mas não ia dar uma dessas. Mas deveria, no final das contas seria uma ótima
memória. Pena que não aconteceu essa nossa briga. Grande Brizola.
Daniel Souza Luz é jornalista, revisor,
professor e escritor
Leonel Brizola pula fogueira de armas de brinquedo, que foram trocadas por livros, em 1982, no Rio de Janeiro. A foto é de Aguinaldo Ramos e não está em domínio público, mas pela leitura desse texto no blog dele suponho que ele não se importa pelo uso não comercial dela. Recomendo muito a leitura deste texto dele contando os bastidores da ocasião em que ele tirou a famosa foto.
No comments:
Post a Comment