Esta resenha foi publicada na página 9 do Jornal da Cidade (de Poços de Caldas/MG) em 22 de janeiro de 2022. Não passou por revisão; depois, se necessário, faço correções.
Depois de conhecer a prosa do
professor Marcos Sturaro Silva, cuja plaquete Aqui, Ali, Todo Lugar foi lançada
conjuntamente com este livro de poesias há duas semanas em Poços de Caldas (e em
dezembro do ano passado em São João da Boa Vista, sua cidade natal), há de se
notar que sua poética é bastante narrativa e coloquial. Isso contrasta
fortemente com o que o editor Cesare Rodrigues informa na apresentação deste
livro: quando lançou independentemente suas duas primeiras obras, a influência
do experimentalismo concretista e a erudição eram as marcas de Silva. Não tendo
lido essas duas edições independentes e fiando-me nisto, destaco que o toque
erudito ainda está lá, pois há citações nominais de Charles Baudelaire, Hilda
Hilst e William Blake, além de outras, implícitas, de Machado de Assis e
Guimarães Rosa, entre outros. É claro que uma releitura revela camadas nas
quais essas leituras formadoras estão subjacentes, mas a contemporaneidade faz-se
mais presente – ou, para ser mais exato, ao menos aquela da juventude do autor,
nas duas últimas décadas do século passado. Além da conterrânea Orides Fontela
e Rodrigo Garcia Lopes, há uma parte final toda dedicada a Ana Cristina César,
quase um livro dentro do livro. Esta é de lavra mais recente, informa o
excelente posfácio de Márcio Cenzi, que também é poeta, é íntimo de Silva e
estabelece muito oportunamente as chaves de leitura do livro. Os demais poemas
foram produzidos num intervalo de quase três décadas, esparsamente, então é
difícil para quem já não os conhecia encontrar um eixo, ao contrário dessa coda
inspirada em Ana C., que, talvez, seja ainda mais lúbrica do que a produção que
a precede. O editor, que é sobrinho de Silva, cultivava com carinho a pretensão
de reunir os poemas inéditos presentes neste volume, conforme ele destaca no
prefácio, mas não se trata, ainda que não haja uniformidade, de uma coletânea
mal-ajambrada. Cenzi afirma que os poemas foram reescritos, cortados ou avolumados
com novos trechos. Ou seja, o livro não é um anacronismo e insere-se vividamente
no torvelinho avassalador desta década infodêmica; o tempo hipermoderno do qual
o poeta Ruy Proença fala na orelha está à espreita – “Já o fim, aquele abraço: biodecompositores
esperam/ por tudo que é tipo de gente.”, vaticina o poema Do Princípio Ao Fim. Mas
o tempo geológico, caro ao autor (dada a sua formação acadêmica), em que ainda
há o que se ossifique, também dá o tom. Confiram em Lírica Bruta, poema de cujo
verso final foi tirado o título do livro.
Daniel Souza Luz é jornalista, escritor,
revisor e professor
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