Esta crônica foi publicada na página seis da edição 7840 do Jornal da Cidade (de Poços de Caldas/MG) em 17 de setembro de 2022. O
Há literatura no Twitter? Há e
muito. É muito curioso quando lembro do desprezo e descrença com que José
Saramago referiu-se a respeito da famosa rede social. Na verdade, é mais uma
rede de informação do que social, para quem sabe usar e tem paciência em entendê-la.
Saramago não se conformava que as pessoas se expressassem em apenas 140
caracteres, que era o limite de toques daquela rede então (hoje é o dobro). Para
ele, depois o que viria seriam grunhidos. Eu não era tão pessimista quanto o
mal-humorado autor português, mas também fiquei incrédulo quanto ao potencial
da plataforma há doze anos. Resolvi entrar e realmente usá-la quando meu amigo
João Fernando Baldan começou a publicar nanocontos lá. Gostei tanto que fiz
isso por anos. Contos minúsculos, com uma frase ou duas, também conhecidos como
minicontos, surgiram em meados do século passado, com Ernest Hemingway e
Augusto Monterosso. Eu já gostava do formato e o Twitter é perfeito para isso. Foi
feito até um livro só com aforismos, minicontos, pensamentos e poesias escritos
no Twitter: Fabrício Carpinejar, que mencionei na crônica da semana passada,
foi esperto e já em 2009 lançou um livro com seus tuítes primevos. É uma pena
que foi justo que se tornou um escritor irregular. Concordo com o juízo dele de
que banalidades têm que ser escritas e, também são, ou podem ser, literatura,
afinal segui pelo mesmo caminho – ao menos naquela rede de microblogs. O
problema é que Carpinejar era um bom poeta que, convertido em figura midiática,
derrapa em generalizações e num pieguismo que depois se tornaria mais
constante. Feita esta observação, a qual lamento, pois ainda o admiro, o livro
também coleta sacadas impagáveis. Vale a pena segui-lo no Tuinto (quem é
tuiteiro se permite a usar a expressão), apesar de alguns pesares, como o faço
desde aquela época. E não há nada de errado em se tornar uma espécie de
celebridade literária, ressalte-se, mas também é fato que, como diz meu amigo
João Antônio Sampaio Chaves, ele é um “escritor de programa da Fátima
Bernardes”. Mesmo caso daquele Bráulio Bessa, que é um poeta popular interessante,
mas também tem o mesmo perfil de ser admirado por cultuadores de
subcelebridades, tipos que compram seus livros e sequer os abrem. Bessa também
está no Twitter, aliás. Hoje, autores em geral usam mais o Twitter para
publicar links dos seus textos do que minicontos ou haikais. É o caso de um
gênio como Alejandro Jodorowsky, o nonagenário cineasta e escritor chileno. É
uma pena. Eu mesmo joguei a toalha e não produzo mais nada inédito por lá. Por
outro lado, quem produz aforismos mesmerizantes quase diariamente naquela rede
é Penny Rimbaud, o octogenário ex-baterista do pioneiro grupo anarcopunk Crass.
Esse sim eu recomendo, sem reservas. E há muitos outros mais, mas em homenagem
ao espírito da concisão, esta crônica será mais curta do que meu habitual e
encerro por aqui.
Daniel Souza Luz é jornalista,
professor, escritor e revisor
Esta era a foto de fundo do meu perfil no Twitter há uns dez anos. |
2 comments:
Nem uso Twitter mais... Acho que tenho uma postagem por ano... rsrs Mas quando usava gostava de acompanhar suas micrônicas.
Muito obrigado, Fabinho!
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