Sunday, October 26, 2008

Não foi dessa vez

Não consegui processar a informação na hora e ainda não absorvi bem o que aconteceu. Foi mais ou menos assim. Ela fumou um e saiu elétrica. O legal é que ela ficou ligadaça e não largada, naquele esquema de ficar rindo de tudo. Como ela nunca havia fumado antes encanou que a polícia a seguia e que a enquadraria – uma menininha daquele tamanho. Correu então para casa e achou melhor escrever o livro com o qual sempre sonhou antes que ela morresse. Porque ela ficou com a certeza de que morreria na viagem que a mãe a obrigou a fazer. No dia seguinte teria que visitar a avó no Paraná, afinal não aparecia por lá há dois anos. E elas iriam de fusquinha. Então ela escreveu o livro durante toda a noite e varou a madrugada. Eu o recebi por e-mail – ela estava preocupada de ter todo aquele trabalho e nunca ser lida. Infelizmente era uma porcaria e não tive coragem de dizer isso para ela. Quando ela chegou sã e salva – teve que ir dirigindo sem dormir, mas disse que ainda foi dirigindo bem – cheguei junto e mesmo assim, mais uma vez, ouvi um não.

Sunday, October 19, 2008

A nova estrela da MPB

O site não tinha nenhuma menção sequer a ele e dois dias já haviam se passado. Manuel apertava o botão de atualização do navegador insistentemente, sem conseguir estudar, ouvindo o início das músicas do seu próprio CD por alguns segundos enquanto aflitamente comia batatas fritas trazidas por “Nanata, a empregada mulata”. Assim ele a chamava de brincadeira quando ela lhe fazia algum agrado. Correu no banheiro, lavou as mãos, pegou o livro de geografia e tentou decorar como seria o relevo da Ásia, seus desertos, pradarias e as cordilheiras irrompendo à força de movimentos tectônicos ao sul e leste. Dois minutos depois atualizou mais uma vez a página e lá estava a foto na seção de notícias. Seu sobrenome estava errado. Putaço, pediu para o seu pai ligar para o dono do site. Além de corrigir o erro, que também mandasse embora o jornalista responsável, de preferência.
Trilha sonora sugerida para a leitura deste conto: Porque Não, Replicantes.

Sunday, October 12, 2008

Hoje à tarde

Escuto meu nome, como se uma velhinha que estivesse sendo estrangulada gritasse por mim desesperadamente, com o que resta de suas forças. Apesar da chuva e do vento frio que empurra as gotas contra minha cara e meu quarto, abro a janela e me deparo com ela, segurando uma bicicleta na mão e ainda insistindo em tocar o interfone quebrado, ao mesmo tempo em que me chama mais uma vez, sem notar que abri a janela logo à sua frente. Peço que espere, desço as escadas correndo e abro a porta e corro até o portão. A chuva fina incomodava relativamente pouco, mas a ventania gelada lembrou-me do sentimento irracional que nutria por aquela menina, afinal se fosse qualquer outra pessoa teria pegado uma blusa antes. É, normalmente sou egoísta, todos adoram jogar isso na minha cara. Mas ela não sabe disso.

Sunday, October 05, 2008

É...

O monitor engordurado e empoeirado lhe inspirava asco e torpor, o teclado em estado semelhante não o ajudava a se concentrar, tampouco. Foi assim que, dominado pela modorra, Jairo viu-se dispensado em favor de um garoto com menos demandas salariais e trabalhistas.