Sunday, April 26, 2009

Enfim parte 4

Os filetes de suor que escaldavam meu rosto são subitamente envolvidos pela água do gélido filete que cai ao lado da cachoeira, e no qual me enfiei ainda de roupa. Que burrada. Meu irmão já está nadando só de cueca nas águas translúcidas do regato que segue diante da pequena queda d’água. Recolho-me assim que enfio o pé descalço n’água.

- Entra de uma vez, será que você nunca vai aprender?

Continua...

Sunday, April 19, 2009

Enfim parte 3

Deixo o motor morrer ao tentar transpor um cupinzeiro inconveniente, crescido bem no lado esquerdo em um trecho estreito da estrada. Pensei que seria recriminado, mas meu irmão abre um sorriso. Em alta rotação constante naquele pedaço difícil, não havíamos percebido o arrulhar manso das águas. Argumentei que estávamos um pouco atrasados devido ao terreno acidentado. Entretanto, ele já abria a porta. “Já prevíamos isto, não é mesmo?”, rebateu desnecessariamente, pois já rumava para a cachoeira, mochila nas costas. Desço atrás, me segurando em galhos que se partem com facilidade, mas me apóio aqui e ali.

Continua...

Sunday, April 12, 2009

Enfim parte 2

Os arbustos vão se quebrando no mata-burro. Em meio aos solavancos, os troncos partidos guincham ao raspar no assoalho. A trilha logo aparece. Está quase coberta pelo mato, mas é nítido o caminho em meio às árvores. A estrada para a antiga mineradora.

Iniciantes não percorreriam 200 metros. Em um atoleiro, perdemos um bom tempo fazendo um calço e guinchando o jipe a uma árvore. Depois tivemos que usar os facões para derrubar dois arbustos que inadvertidamente cresceram no meio do caminho. Avançamos lentamente, escorregando no limo, perigando tombar em desníveis escondidos pela vegetação, mal nos mantendo na estrada já quase indistinta da mata e que nos é delineada pela trilha da cachoeira.

Continua...

Sunday, April 05, 2009

Enfim - parte I

A rua de terra batida morre em uma borracharia quase inacessível devido à lama frente ao portão de madeira. Sobre a pintura azul descascada das tábuas mal ajambradas está rascunhado porcamente com tinta preta: “Nao fazemos fiado”. Não há sinal de atividade. Batemos palmas. Ninguém aparece. Empurro o portão rangente. De dentro, sai um senhor calvo. Olhos vermelhos, barba rala branca, botinas cheias de barro, a roupa toda esgarçada. Não precisava chegar perto, mas ao se aproximar tivemos certeza que estava alcoolizado.

- Pois não? - é o sentido que parece ter o bafo de cachaça aspergido pelo ar que ressoa aos ouvidos e se insinua desagradavelmente narinas adentro. Gotículas de saliva pousam na minha bochecha.

Explicamos que ouvimos dizer que há uma antiga estrada que prossegue atrás da borracharia, e que gostaríamos de conhecê-la. Ele franze a testa e balança, parecendo se perguntar o que está fazendo ali. Depois levanta os olhos, mantendo a mesma expressão apalermada, dirigindo-os ao meu irmão. Por que estávamos querendo saber de uma estrada abandonada? Para fazer reconhecimento para um rali. E por que faríamos isso domingo de manhãzinha? É nosso hobby, um grande prazer, somos da federação de automobilismo off-road.

Contorno o galpão com o jipe. O espelho esquerdo raspa no muro; o espaço é muito estreito. Vagarosamente, evitando pedras pontiagudas enterradas na terra, dirijo paralelamente às árvores do fundo até um pequeno declive, onde há uma vegetação rasteira. O tiozinho explica que ali a estrada fazia uma curva, e que era só descer um pouco até uma trilha que eventualmente é usada por alguns moleques que nadam em uma cachoeira no meio da mata. Dou um dinheirinho para ele; abre-se um sorriso de dentes amarelados.

- Então vamos? – quase suplica meu irmão, ansioso.

O velhinho se espanta, mesmo ciente de nossas intenções desde que chegamos. “Vocês vão descer mesmo?”. Claro, é uma quatro por quatro, estamos acostumados. Nos despedimos, e ele, estranhamente, bate continência. Olho para meu irmão, que ignorou o gesto, mantendo o olhar fixo na descida. Ótimo, precisamos de foco.

Comecei esse conto mais longo em meados de 2004 e, apesar de a trama ainda avançar muito, deixei-o pela metade. Espero conseguir terminá-lo agora.