Monday, December 28, 2015

Birthday Party

Era meu aniversário de sete anos. Estava na escola. Não via sentido nisso. Era meu aniversário! Devia estar em casa assistindo desenho animado na televisão ou jogando futebol de botão ou futebol de verdade com meu irmão.
A aula parou. Entraram com um bolo de aniversário e chamaram até o meu irmão para vir na minha sala! Não há nada mais encantador para uma criança, ao menos para a que eu era, que fazer uma sala de aula parar para uma festinha. Basta dizer que nunca mais vi isso acontecer.
Foi a minha última festa de aniversário nos anos oitenta. Minha mãe e meu pai só me davam presentes e boa. A próxima festa de aniversário que tive foi uns vinte anos depois. Mas aquela de 1981 me bastou esses anos todos.

Monday, December 21, 2015

Mercenárias

O disco só roda em 45 RPM. Por sorte meu aparelho de som tem esse recurso . Achei num sebo. É de 1987. Estamos em 1989. A banda não existia mais há um ano, descobriria numa revista Bizz, também comprada num sebo, uns dois ou três anos depois. Estava vivendo intensamente algo que já havia acabado. Os anos oitenta tinham muito disso, o apartamento onde vivia era uma caverna de Platão, nos quais as sombras dançando ao fundo não eram sombrias, mas sim tão fascinantes quanto um teatro de sombras é para uma criança – a qual eu ainda era ali, com 14/15 anos.

Uns dois anos depois mais ou menos, em 1991 ou 1992, minha irmã e suas amigas descobrem o disco, decoram umas letras, cantam junto. Elas adoraram, era uma banda só de mulheres, novidade para elas, com a qual se identificaram. Elas tinham 10 ou 11 anos. Eu fiquei enciumado. Era a MINHA banda. Eu devia ter incentivado-as a montarem uma banda influenciada pelas Mercenárias. Faltou empatia. A empatia que elas tiveram.

Monday, December 14, 2015

Wire


Invasão de propriedade. Nunca vimos como maldade ou crime. Criança não conhece essas fronteiras. Sabem que elas existem, mas se não estragamos nada, qual o problema? Nos anos oitenta, com o fim da ditadura, tudo tinha cheiro de liberdade.
Uma das melhores lembranças que tenho da época é pular dentro do pátio de uma loja de pneus e artigos automotivos que ficava fechada do sábado à tarde em diante e ficarmos andando de skate no cimento liso daquele lugar tranquilo, que até hoje permanece exatamente igual, pois, claro, nunca estragamos nada, não queríamos ser descobertos e repreendidos – ainda tenho vontade de pular lá dentro. No ano passado cheguei a andar no pátio aberto na frente, que também é grande e propicia bons rolês, mas não tem tanta graça quanto pular aquele muro.
No mesmo quarteirão dessa loja, o de baixo da minha casa, tinha uma fábrica de chocolates na qual ia, quando criança, com a minha mãe; lá, um funcionário sempre me dava bombons! Não bastasse essa boa memória, há outra. Uns dez anos depois, como ela faliu, eu, meu irmão e uns amigos resolvemos pular o muro. Que surpresa: tinha uma piscina vazia lá dentro! Com uma parede curva, que acompanhava a esquina, pois a piscina ficava num canto da fábrica. Não tinha transição, tínhamos que andar lá dando wall rides. Era divertido, mas fomos pouco lá, pois não éramos tão bons nisso. Foi o mais perto que já cheguei de andar de skate em uma piscina como as da Califórnia – é uma pena mesmo as daqui não ter transições.
Andar de bike e entrar em fazendas ou áreas de represa ou usinas de força (ou algo assim) era mato – literalmente também. O problema sempre foram os arames farpados, alguns enferrujados. Um de nós às vezes se enroscava. Bons tempos – sei que essa expressão é clichê, fazer o quê? – mas bons tempos mesmo em que as grandes enroscadas eram essas.  

Monday, December 07, 2015

Hüsker Dü

1988 ou 1989.

Na entrada do prédio, após virarmos o corredor à esquerda – seguindo em frente chegava-se ao quintal onde penduravam as roupas nos varais – jogávamos uma brincadeira de bolinha de plástico, dessas que quicam muito, que inventamos da nossa cabeça. Ficávamos sentados, não podíamos levantar, e batíamos na bolinha com a mão. Se passasse atrás dos jogares do outro time, era ponto. Fomos precursores de uma forma primitiva de goalball.
Os vizinhos não gostavam muito dessa ideia não, eles tinham que passar por ali. Mas era de tarde. Não dava nada.
Você se lembra?
Hoje sonhei que a Menina, a cachorra da minha irmã, estava no corredor e que ainda morávamos lá. Logo acordei, alertado pelo anacronismo da cachorrinha que ainda nasceria muitos anos depois de nos mudarmos de lá. Lembrei-me do jogo que inventamos, nunca pensamos nisso. Talvez só eu ainda me lembre.