Sunday, February 15, 2009

Balada Errada 2

A luz negra realça o seu vestido branco. Ela joga os cabelos para os lados, os braços para cima, ensaia uns passinhos de samba. Drum n'bass brasileiro. Como todo mundo que que havia descoberto isso ontem, tinha os quadris duros. A lábio e o requebrado ainda hão de funcionar. Aproximo-me, deixo solto meu lado Dudu Nobre, ela sorri.

- Na minha quebrada, você não enganaria ninguém.

Berro isto três vezes. Vale a pena. Ela começa a rir, a cara enfiada no meu ombro, as mãos apoiadas em meu peito enquanto mexe aqueles tênis brilhantes. Começa o poperô. Eu não quero ficar no meio daquela tenda cheia de barro. Ela quer. Ainda agüento três “músicas”. Tsi, tum, tsi, tum, tsi, tum.

Desisto, não estou com paciência pra ficar mimando madame criada por FMs. Olho para a casa perdida no meio do mato, faço menção com a cabeça de que vou pra lá, e saio abrindo caminho em meio ao povinho fashion. Chegando perto da janela, me viro e só vejo os clubbers de sempre. Hora de vazar. Ao encostar-me na parede para descansar um pouco, vejo uma ruiva empurrando uns agroboys. Ela me seguiu.

A porta da frente está trancada. O único jeito de entrar é pelo buraco do cachorro da porta de trás. Quando ela engatinha pela portinhola, eu penso na minha adolescência, no banheiro de azulejo rosa, e me pergunto por que nunca fantasiei isto antes.

Só havia luzes vermelhas bem fraquinhas no corredor. Os cômodos são insondáveis. Não consigo ver nenhum dos famosos sofás para amasso que tanto havia ouvido falar. Ela ri do meu desconforto, e, tropeçando nas próprias pernas, arranca uma lanterna da bolsa. Gargalha ao apontar o facho para um quarto. Têm quatro, cinco pessoas por sofá. Todos homens, acho. Subindo correndo as escadas, ela gargalha ainda mais.

Tomo a lanterna de sua mão. Mas ela tem uma idéia pior. Acende a luz de um dos quartos. Ninguém acredita. Vários casais seminus naqueles sofás e... Tony em cima de um magricela com a cara enfiada em almofadas. Ambos com as calças arriadas. Pô, Tony.

- Apaga a luz agora, o que você está olhando?! – Estou olhando ele fechar o zíper, e agora me sinto duplamente otário.

- Porra Negão, justo você, me fazer este papelão - Tony arfava indignado.

E ela ri alto, mais ainda enquanto Tony nos puxa pelos braços através do corredor. Ele nos joga com toda força em um banheiro. Tem um sofá! E nele caímos. Ela me pergunta quem era meu amigo. “Segurança da rave”. Seus risos ficam ainda mais histéricos.

Acendo a luz. Boca borrada de batom, maquiagem pesada escorrendo junto ao suor, faróis acesos. Senhorita roubada, o que vamos fazer?

- Quer tomar essa pílula azulzinha? Um sorriso sacana é esboçado.

- Não preciso disso.

- Nem eu - e ela engole aquilo. Portanto, apago a luz. Era a deixa.

Tony e outro segurança entram com os fachos das lanternas em nossas caras. Vingança. É justo. Somos arrastados pra fora da casa. Saio atrás dela, e não acredito no que ouço:

- Amor, onde você estava?

Mesma roupa, mesmo cabelo. É o rapazinho magrela do Tony. Com a minha mina. Abraçando-a. Dois pombinhos. Saem de mãos dadas. Nenhum deles olha pra trás. Tony, ao meu lado, parece mais resignado.

- A vida é assim. Negão... escuta, a galera do bairro, eles não precisam saber...

- Saber do quê? Não sei de nada.

A casa treme. São os graves do som estourado, ou... Esquece. Não volto lá para descobrir.



Pensando bem, acho que esta é a versão deste conto publicado na revista Ops! e a versão que publiquei aqui no ano passado é a versão original, mais longa, que pensei que havia perdido. Depois preciso achar a revista para confirmar isso, mas é 99,99% de certeza.


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